Como costumo falar nos meus cursos de capacitação, para se ter uma aula bem planejada, é preciso de uma espinha dorsal, um roteiro para que as atividades não fiquem desconectadas, perdidas no ar. Dentro dessa espinha, deve existir sempre um momento para que os alunos pratiquem. Afinal, nosso país não oferece a exposição necessária para estimular o par oralidade/audição, pilares da aquisição de qualquer língua, e aqui, mais especificamente, a língua inglesa.
Mas, você já foi procurar saber o motivo de a fase de prática ser tão importante para os alunos? Já foi atrás do que acontece quando somos expostos a um idioma que não é o materno? Quando Tomasello (2005) diz que usamos nossas funções superiores para aprender algo que vimos em uma interação social – quer seja explicada, quer seja de maneira espontânea – uma série de raciocínios acontece até que a fala de fato seja produzida.
Em nosso cérebro, antes de produzirmos nossa fala em uma segunda língua, planejamos o que iremos dizer com antecedência, isto é, fazemos uma varredura mental para colocarmos as palavras nas gavetas apropriadas para exprimirmos nossa intenção (grammatical encoding).
Pra que isso aconteça, fazemos uso de conhecimento prévio sobre o novo idioma, sobre nosso idioma e sobrepomos ao que sabemos sobre a percepção e comportamento de nativos em relação ao idioma (Ly e Lx respectivamente).
Após essa fase, Segalowitz prossegue com esse mapeamento cognitivo de processamento de L2 para produção oral e mostra que após o momento de se pensar na fundação da língua, nós partimos para os “átomos”, ou seja, planejamos a parte morfo-fonológica da fala – palavras. Nessa segunda fase, trazemos à superfície nosso conhecimento com relação à articulação e combinação fonológica e comparamos com os gestos dos falantes nativos. A intersecção oferece os modelos fonológicos que usaremos quando falarmos.
Tudo isso ocorre em pouquíssimos segundos conforme vamos utilizando nosso cérebro. Embora tenhamos, sim, uma área em que fazemos processamentos linguísticos (lóbulo temporal esquerdo), seria errado dizer que somente essa parte é responsável pela produção da nossa fala.
Oras, se estamos falando de planejamento, estratégia e escolha lexical, não somente o lóbulo temporal vai ser ativado, mas também a parte frontal do cérebro, responsável por essas funções (Bailer, 2016). Isto é, quando encorajamos a fala de nossos alunos com atividades de prática em sala de aula, estimulamos uma atividade cerebral intensa com uma simples tarefa.
Às vezes temos outros fatores que influenciam na fala de língua estrangeira como, por exemplo, contexto comunicativo. Quando preparamos nossos lesson plans e seguimos aquela espinha dorsal que mencionei no início deste artigo, estimulamos um ambiente em que os alunos percebem esse viés comunicativo, fator que muitas vezes faz com que os próprios alunos se sintam envergonhados, com receio de falar quando não há esse tipo de ambiente.
O momento de prática oral dos alunos não é simplesmente pedir que eles criem frases com o conteúdo recém ensinado, pois embora as funções superiores estejam sendo acionadas (conforme foi explicado anteriormente), não existe contexto nem motivação para que as frases sejam faladas – fatores sociais importantíssimos que são gatilho para oralidade.
Além disso, a fala pressupõe que haja interlocutor, ou seja, ter uma fase de prática no plano de aula não somente propicia a fala, mas também explora a habilidade auditiva dos alunos que, ao ficarem expostos a fala também fazem uso do esquema cognitivo de produção, só que em vez de auto percepção (f7), há uma ativação da percepção externa da fala e as mesmas ativações de conhecimento morfo-fonológicos e de estruturação de frases para que haja entendimento do que está sendo falado.
Além disso, a fase de prática do plano de aula é o momento em que se busca precisão da língua. Portanto, as correções e repetições acontecem durante esse momento, e, conforme podemos notar na Figura 2, frequência de exposição e repetição são fatores que favorecem o esquema cognitivo da produção oral da língua estrangeira.
Com tudo isso, podemos notar que estabelecer um momento de prática bem estruturado em todas as aulas de segunda língua traz benefícios que extrapolam os fatores pedagógicos. Existe todo um suporte linguístico por trás dessa abordagem que pode auxiliar na hora em que você for se sentar para planejar suas aulas e atividades.
Mesmo que você utilize a maioria das atividades do seu teacher’s guide (espero que não faça isso e desenvolva mais), a fase de prática precisa acontecer para que seus alunos tenham a chance de trabalhar a oralidade de maneira natural, relevante (sempre) e divertida.
Esse texto é uma adaptação do artigo publicado por Rodolfo Mattiello no blog da Mattiello Consultoria.
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