Desde o nascimento, o ser humano aprende muito sobre as pessoas e o mundo ao redor a partir dos cinco sentidos: visão, olfato, paladar, audição e sensação (tato). De acordo com o desenvolvimento individual de cada um, dependendo dos estímulos e de algumas particularidades, um sentido pode tornar-se mais apurado que o outro.
Pense agora no exemplo de uma criança, entre 3 e 5 anos, que acaba de entrar com a mãe em uma loja. O primeiro instinto infantil é o toque: ela vai querer mexer nos itens, explorar forma, peso, textura. O estímulo tátil é, de fato, o maior instinto de exploração humana: checamos se alimentos estão bons, se o tecido nos agrada, se alguém tem febre, entre outras situações.
Porém, como também vivemos em um mundo – atualmente – muito visual e auditivo, essas são as duas áreas que recebem estímulos constantes; por vezes até excessivo. As informações visuais não podem ser sobrepostas à necessidade de explorar o nosso tato. Há de se considerar um equilíbrio.
A construção do conhecimento linguístico e da aprendizagem bilíngue: investigação, sensação e percepção
O conhecimento é uma síntese das interações entre pessoas, ambientes e objetos; sensação e percepção. A sensação define-se pela experiência sensorial com origem nos cinco sentidos, enquanto a percepção é a interpretação que cérebro tem da sensação recebida.
Por meio da exposição atenta a diferentes sensações, a criança parte do contato com o que é concreto. São momentos de contínua exploração interna e externa: como se sente, texturas, gostos, sons e tons de vozes.
Embora o cérebro do bebê ainda não esteja 100% formado, as informações adquiridas (por meio de todos os estímulos externos) são transmitidas pelos neurônios, criando conexões entre eles e fazendo com que a inteligência e a cognição se desenvolvam.
A aquisição da linguagem, de acordo com Piaget, constrói-se a partir de noções palpáveis de mundo, observação do que é tangível, e só a partir daí desenvolve-se um entendimento linguístico – a partir do começo de um pensar mais abstrato, estando também em contato com falantes da língua que precisa aprender. Eis a importância de um ambiente como em uma escola bilíngue: a exposição à segunda língua em ambiente de aprendizado e letramento.
Estímulos
O que significa “estímulo”? Segundo uma das definições do dicionário, é aquilo que incentiva ou impulsiona a atividade de um órgão para aumentar a adaptação do ser vivo ao seu ambiente.
Além da sala de aula – principalmente na educação infantil – ser um ambiente propício ao desenvolvimento, com estímulos visuais (e materiais) adequados para cada fase (quadros de letras, números), a criança enquanto estudante, gradualmente aprende a reconhecer o lugar de estudo, as interações sociais que o compõem e a diferenciar os professores que falam a língua mãe e os que ensinam na segunda língua.
Mesmo que, a princípio, não haja por parte da criança uma fala bilíngue em si, a exposição ao estímulo sonoro e visual da professora usando diferentes técnicas e recursos faz com que as conexões mentais sejam mais ágeis e diminuam a lacuna entre o entendimento da língua materna e da segunda língua. A internalização acontece até que, naturalmente, a criança, ou adolescente, possa se expressar em seu tempo.
Porém, mais do que o estímulo auditivo, a experimentação física exerce um papel crucial na aquisição da linguagem e na construção de sentido. Para que uma criança aprenda novas palavras e seja capaz de nomear objetos, é preciso não só que ela tenha como perceber a relação entre as palavras e objetos, mas também que ela tenha como explorar esses objetos. O aluno observa, toca, ouve, sente e aprende sobre seu entorno, criando e entendendo significados – inéditos até então.
Gosto da definição de Paul Schilder, médico vienense, sobre nossa pele. Ao mesmo tempo em que nos protege, ela também é um dos nossos primeiros meios de comunicação. Por ser um dos órgãos mais sensíveis, com um número enorme de receptores, é a nossa principal mediadora entre o “ser” e o mundo.
Maria Montessori, por exemplo, também entendia que o caminho do intelecto passa pelas mãos – numa clara alusão a nosso passado artesão – e defendia que as atividades favorecessem o toque e o movimento. Fazendo o esforço de explorar as propriedades concretas de diferentes objetos (tamanho, forma, cor, peso, cheiro), selecionados para diferentes propósitos, o aluno seria equipado para compreender conceitos ou vocabulários mais abstratos.
Motivação
Motivação, do latim moveo, significa pôr em movimento, mover. O motivo é uma força interna; o estímulo desperta os motivos. O trabalho de um professor está justamente em providenciar os estímulos corretos para motivar cada grupo de idade.
A educação de um programa bilíngue com experiências sensoriais, táteis, busca o prazer do estudante dentro de suas capacidades e necessidades. Ao ter diferentes partes de seus sentidos explorados, ele sente prazer e se concentra mais, fazendo com que a atividade seja memorável. A sensação de progresso acaba sendo maior, já que se sente a evolução de forma palpável, tornando o aprendizado prazeroso.
Com o prazer e as atividades concretas, a aprendizagem deixa de ser apenas receptiva e passa a tomar uma dimensão de performance: produção oral e presença. A performance implica competência, concretiza o que foi estudado, estabelecendo um vínculo não só entre professor e aluno, mas também e principalmente entre aluno e linguagem.
O estudante que tem seus sentidos despertados, apropria-se do ritmo do processo de aprendizado e soma com a percepção que teve acerca da língua enquanto matéria, ensinada pelo professor.
Apesar de jogos coletivos e atividades (assar um bolo de verdade; segurar, cheirar e cortar frutas; fazer alguma atividade de construção com papel ou madeira) serem muito úteis na educação bilíngue fundamental e infantil – exatamente por conta dos processos orgânicos de aquisição da linguagem – essas experiências sensoriais não devem ser deixadas de lado nas fases posteriores do desenvolvimento humano.
Existe um lado do ser humano que acaba sendo abafado no processo de crescimento com a aprendizagem tradicional: o espírito curioso e investigativo. Traços infantis como o desejo de compreender o seu entorno, questionar e de absorver o máximo das atividades em que participa, nascem conosco e continuam em nós enquanto crescemos.
Com adultos ou adolescentes, o estímulo sensorial serve como uma ativação prazerosa de conhecimentos que ele já possui, mesmo que de forma inconsciente; traz de volta o espírito questionador enquanto resgata uma série de significações da língua materna pré-construídas cognitivamente.
Autor: Vanessa Vieira
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