Em tempos intermináveis de isolamento social, nossos alunos estão adequando-se cada vez melhor ao novo meio de aproximação: as telas. Nós, professores, nos reinventamos todos os dias para tentar manter vivos o contato, o afeto e a aprendizagem, antes sempre construídos com o calor da troca presencial.
Além disso, ainda é preciso cultivar, no mundo da educação infantil online, a atenção dos pequenos. É preciso manter a empolgação no reino de tão, tão distante, e suscitar a pergunta – o que será que vai aparecer hoje do lado de lá do computador?
É comum que, nas salas de aula, uma atmosfera de suspense anteceda novos elementos, surpresas, histórias. Recebemos olhares curiosos e atentos, que interagem ativamente com a novidade – seja ela nosso mascote novinho em folha, ou mesmo um bonequinho desenhado em palito de picolé.
Mas o que e como fazer para que as crianças não ignorem completamente a presença do professor nos encontros síncronos? Ou para que, nos vídeos gravados, não desistam de te olhar, por não poderem tocar, perguntar, mostrar? O que você tem a dizer, em outra língua, pela tela, que é mais interessante do que curtir a casa, os brinquedos, a família?
É aí que o suspense se mostra uma importante ferramenta pedagógica. Poderíamos simplesmente mostrar um coelho da Páscoa e dizer “olha, esse aqui é o Easter Bunny. É ele quem traz os chocolate eggs”. Ou apontar para nossos olhos, nariz e boca e ensiná-los as partes do rosto em inglês. Ou anunciar: “agora vamos ouvir a história ‘x!”. (E, tudo ok, porque já é bem difícil dizer isso para a câmera…!)
Mas não é exatamente assim que funciona o mundo infantil, certo? Por acaso a doçura da Páscoa é mesmo o ovo de chocolate? E a magia do Natal está só em ganhar presentes? Se não há Papai Noel, uma meia na janela, procura pelas renas no céu; se o Coelhinho não chega de olhos vermelhos e pelo branquinho, se não deixa suas pegadas para a caça aos ovos… Para que esperar a Páscoa e o Natal? E, principalmente, para que esperar o próximo minuto do vídeo da teacher?
Mas, opa! – Ouço passos… E vejo uma luzinha vermelha lá longe! Não acredito, quem vocês acham que é? Será? É isso mesmo! É o coelhinho da Páscoa! Parece que ele trouxe alguns presentes… São… ovos de chocolate! Quantos ovos será que ele trouxe? Um? Dois? Três? OMG! Ele trouxe DEZ ovos!
E tenho outra surpresa… Quem será que adivinha? É uma nova história! Será que vocês já conhecem essa? Me contaram que tem uns animais da fazenda… E eles constroem casas! E também tem um personagem muito, muito mau… Que história será essa? E, além da história, eu tenho um novo amigo muito fofo, de quatro patas. Com grandes olhos, nariz e boca… O Brownie adora ele! Vocês querem conhecer?
Sempre podemos mergulhar juntos nesse reino colorido, onde nada se mostra facilmente; tudo se sugere. Você precisa continuar ali, com aquela ansiedade boa, uma expectativa gostosa para saber o que vai se apresentar, qual será a surpresa. Não saber é a motivação para querer descobrir. E o caminho para a descoberta funciona como mágica: retém a atenção, encanta e parece até ajudar na fixação.
Nos tornamos professores youtubers, fazemos lives de ensino infantile, entre tantos desafios e ferramentas tecnológicas, temos que voltar ao básico e aprender a adaptar. Dar tempo para pensar, para interagir – mesmo sem, muitas vezes, poder ouvir as ideias e responder às interações.
Precisamos tentar cultivar, nos alunos e em nós, a motivação, a vontade e a alegria, para revisitá-las quando retornarmos ao “novo normal”. Precisamos manter a naturalidade quando nada é natural, firmeza emocional quando estamos derretendo. E aprender com os nossos pequenos – como sempre, eles nos ensinam – a aceitar os mistérios, as incertezas, o incontrolável e, ainda assim, continuar com boas expectativas e atentos até o fim.
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